Outrora Ateliê

Essa foto foi tirada no casamento de uma amiga. Talvez por isso eu não consiga olhá-la sem associar imediatamente à ideia de casamento — e, curiosamente, sem ouvir uma música do Bruno Mars “Marry You” tocando na minha cabeça.

O estranho é que, sempre que vejo essa foto, um sorriso escapa. E me pego pensando: no fundo, eu não vejo a hora de me casar. Pode soar hipócrita, pode parecer ridículo, afinal, passo boa parte do tempo questionando justamente essas concepções contraditórias, moldadas por um olhar machista sobre a mulher.

Porque, se for olhar criticamente, sei bem o peso histórico que o casamento carrega: o de ser visto como a grande conquista de uma mulher, a sua suposta “realização final”. Como se o destino inevitável fosse esse: tornar-se esposa, depois mãe, e, no processo, perder-se um pouco (ou muito) de si mesma. O problema não é casar, é a imposição de que isso seja obrigação, como se fosse um roteiro pronto. Tanto que, quando uma mulher diz que não quer casar, a sociedade estranha, se incomoda. Mas por quê? Por que ainda precisamos justificar a escolha de não seguir um script que nem fomos nós que escrevemos?

E o mais irônico: eu mesma critico o imaginário romântico que nos empurram desde sempre — os filmes, os contos de fadas, o príncipe salvador, a princesa indefesa. E penso: por que, afinal, esperam que a mulher precise ser resgatada, quando já sabemos que somos plenamente capazes de nos salvar sozinhas?

Mas, ao mesmo tempo, confesso: eu gosto desses clichês. Eles ainda me pegam. Eu ainda me imagino naquela cena brega de caminhar até o altar ao lado do meu pai, mesmo sabendo que, simbolicamente, aquilo carrega o peso de uma transferência de posse: de um homem para outro. Então me pergunto: é tão errado assim sonhar com alguém que escolha estar comigo, que me ame e que eu ame de volta, mesmo sabendo que o amor nunca é incondicional?

Trabalhei em muitos casamentos. Passei noites em pé, cansada, vendo gente bêbada cantar aos gritos “eu não vou emboraaaa” (e eu, por dentro, implorando: vai embora sim, pelo amor de Deus), enquanto contava os minutos para poder ir para casa. Ainda assim, entre uma música e outra, me pegava desejando: que um dia fosse eu ali, também sem querer ir embora. Porque, no fundo, era isso que eu via: pessoas tentando aproveitar ao máximo um instante que sabiam ser único.

E apesar de todas as críticas, não consigo deixar de ser romântica. Talvez até ingênua. Mas quando vejo um casamento, escolho enxergar o que há de bonito: a celebração do amor, a tentativa de eternizar um momento, o desejo de construir algo em conjunto.

Talvez seja utópico imaginar alguém que queira o mundo ao meu lado, não para me resgatar ou me definir, mas para caminhar comigo. Alguém que conheça os meus gostos, que se interesse por eles. Alguém que, sim, tenha essa coisa dos clichês românticos: o sentimento de amar e estar disposto a enfrentar o mundo — não por mim, mas comigo. Construindo algo juntos, realizando sonhos, conquistando novos objetivos e, acima de tudo, me escolhendo. Pode soar egoísta, mas não no sentido de ser prioridade cega, e sim de enxergar valor naquilo que estamos construindo, e levar isso em consideração.

Eu sei que os clichês não mostram as brigas, os silêncios, os desencontros. Encerram tudo no “felizes para sempre” sem contar o que vem depois. Mas será tão ridículo acreditar que possa existir alguém disposto a, pelo menos, tentar fazer esse “para sempre” ser real?

E é aí que me encontro: entre a crítica e o desejo, entre o riso irônico e a esperança ingênua. Porque sou humana, e ser humana também é ser contraditória. Posso criticar e desejar ao mesmo tempo — uma coisa não anula a outra. Aliás, dar voz a essas críticas é parte essencial do relacionamento que eu quero construir, e do que qualquer pessoa deveria poder construir: uma relação livre de papéis enraizados, mas cheia de escolhas conscientes.

E, ainda assim, mesmo sabendo de tudo isso, sigo desejando o ridículo: um amor inexistente.

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